segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

O sonho de Luiza

Aviso: Luiza existe, é de carne, osso, sangue e suor. O sonho que será narrado realmente aconteceu. Não como fato, mas como sonho. Boa sorte.


Pois bem... Conversando com Luiza, talvez ontem ou anteontem, ela me confessou (ou melhor, só me contou mesmo) ter tido um sonho que se consistia do seguinte: Luiza voltava no tempo, até o primeiro ano do Ensino Médio, estava sentada em um jardim de sua cidade e foi-lhe dado o direito (e o poder) de reescrever aquilo que havia dado errado em sua vida. E assim, ela foi escrevendo uma lista. Não faço a mínima idéia do que se encontrava nesta lista além do único item que Luiza me contou.

IMPEDIR QUE CARLOS SE CONVERTA.

Para Luiza, e isso ela me confessou enquanto me contava o sonho, minha conversão, ou melhor meu engajamento no trabalho cristão é que era a raiz dos problemas de minha vida. Ela conhece bem os meus problemas, por isso fiquei surpreso com a sua conclusão. Nunca poderia imaginar que minha vida cristã pudesse estar surtindo esse tipo de feedback na vida de uma pessoa que me ama tanto quanto ela.

No meio da conversa ela resolveu parar porque disse que estava com medo que eu achasse que ela estava com o demônio no corpo, ou algo assim.

Então eu pensei (e continuo pensando) se há alguma possibilidade de Luiza estar certa, e se minha conversão, ou melhor, meu engajamento na "obra de Deus" não estivera, ao longo desses anos, me fazendo tão mal à ponto de isso ficar claro para as pessoas não-cristãs à minha volta.

Uma coisa é certa: minha vida nestes últimos quase dez anos simplesmente não decolou.

Não decolei como cristão. Reconheço e confesso que poderia orar muito mais, ler mais a Palavra, ser mais piedoso. Já fui um cristão muito melhor, no sentido religioso da coisa.

Não decolei como profissional. Enquanto estava na faculdade creio ter recebido um chamado divino para pastorear pessoas, assim, deixei de lado toda e qualquer vontade de seguir em minha profissão, a tal ponto que desde que me formei nunca exerci nem um segundo sequer o ofício que fui preparado para exercer.

Não decolei como pastor. Eu simplesmente não consegui assumir o ministério para o qual fui convidado. Não me sinto digno nem gabaritado para exercer tal função, o que cria um paradoxo em minha mente porque se por um lado eu não me sinto pronto, do outro lado eu direcionei minha vida inteira para isso, não sabendo fazer qualquer outra coisa senão pregar, escrever e aconselhar pessoas.

Não decolei como teólogo. Descobri que a teologia é muito mais um instrumento que nos afasta de Deus do que uma benção na vida de um cristão. Mas ter descoberto isso, meio que acabou com meu chão, pois eu estava sendo preparado (por mim mesmo) para o labor teológico junto aos meus pares. Agora isso se foi.

Não decolei como homem. Neste tempo namorei duas meninas. Uma eu fui digno e desmanchei porque não gostava dela, até ai sem problemas, coisas da vida. A outra eu me entreguei emocionalmente de tal maneira que ela entrou para a minha história como sendo a única pessoa deste mundo que ouviu de minha boca "eu te amo" com toda a sinceridade que uma alma aberta pode ter. Mas ela talvez não tenha conseguido conviver com alguém como eu, cheio de altos e baixos. Mulheres buscam segurança nos homens e naquele momento eu não era exatamente a pessoa certa para segurar ninguém. Tanto foi assim que a disse que eu mesmo acabaria sendo a causa de não ficarmos juntos. Não deu outra...

Não decolei como pessoa humana. Mais do que nunca, eu sou um homem em tratamento, cheio de impurezas emocionais que dariam um bom compendio psicológico. Não consigo entender a vida de um modo simples, não consigo vivenciar as coisas boas da vida como amar, andar na praia, sentir o sol na minha pele e o vento no meu rosto. Viver para mim é pesado, árido, difícil e penoso. É a verdade.

Simplesmente não decolei.

Mas você pode se perguntar, o que meu suposto fracasso tem a ver com o fato de eu ter recebido Jesus em minha vida?

Acho que nada. Até porque não tenho a capacidade (nem a vontade) de saber o que seria de mim se naquele dia eu simplesmente dissesse NÃO ao Espírito Santo.

Essas coisas me lembraram a águia. A boa e velha águia, que o profeta Isaías disse que voaríamos como águias e autor do Êxodo diz que Deus levou o seu povo até ele com asas de águia.

Interessante...

Interessante porque águias têm seu ninho nos cumes mais altos e quando elas querem ensinar seus filhotes a voar elas simplesmente os pegam com o bico e os arremessam montanha abaixo. Então elas voam, voam rápido para debaixo de seus filhotinhos, para que se ele não conseguir voar, ela o aninhe em suas asas de águia e o leve em segurança de volta ao ninho.

Eu não decolei.

Mas estou há dez anos sendo arremessado e voado nas asas de minha Mãe-Deus, Mãe-Águia, e talvez agora, depois de tudo isso, possa dizer como o escritor sagrado:"Vós tendes visto o que fiz aos egípcios, como vos levei sobre asas de águias, e vos trouxe a mim"

2 comentários:

Anônimo disse...

O Sonho de Luíza...
Não conheço Luíza...não sei se quero conhecer...
Eu conheço o Carlos...
Conheço o escritor, o teólogo, o pastor e o amigo (necessariamente nessa ordem).
Reconheço o escritor, o teólogo, o pastor e o amigo.
Na minha vida, Carlos decolou...
Camilla

Anônimo disse...

Me identifiquei muito com o texto.Também não decolei em tantas áreas. Tantas fugas, crises, um sentimento que não vai embora, a sensação(que é a realidade)da vida estar estagnada...Bem, fracassar é comum. Até de forma generalizada como nosso caso... (riso)Mas registro aqui minha admiração pela sua inteligência. Sua forma de pregar é incrivelmente instigante.Fico encantada.